domingo, 5 de dezembro de 2010

pseudo

tudo é fingimento; eu saio do banheiro reafirmando que tudo não passa de uma peça absurdo. na sala ela e ele discutem. no quarto outro ele e ela se beijam e uma gata me olha. eu me acho poeta, eu quero me acreditar poeta. entre taças de vinho e tantas falas uma gata me olhando, eu quero que a noite não termine. quem me saberá amanhã. eu não me sei.

domingo, 14 de novembro de 2010

gadelha.

eu ajusto o céu,
ele colhe o horizonte.

talvez meus braços lhe sirvam
talvez suas pernas me caibam

e no nunca desconfigurado fingiríamos o beijo.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

nunca o meu, sempre o dos outros.

Levantou-se, pela simples leveza do ato de se levantar, sem objetivos, sem prerrogativas. Ergueu-se por não poder mais continuar deitado. Como se deitado já tivesse esgotado as conjugações desse verbo. Não lavou o rosto, talvez nem tenha aberto os olhos, caminhou pra janela, tateou, sentiu o outro lado e se jogou.
Levantei-me, pela simples leveza do ato de me levantar, sem objetivos, sem prerrogativas. Ergui-me por não poder mais manter-me deitado. Como se em decúbito dorsal já tivesse esgotado todas as conjugações do verbo deitar. Não lavei o rosto, talvez nem tenha aberto os olhos. Tatei, até a cozinha, abri a geladeira e lá me guardei.
Levantamo-nos, pela simples crueza do ato de nos levantar, sem objetivos, sem prerrogativas. Erguemo-nos por não mais podermos continuar esperando. Como se abraçados já tivessemos esgotado as conjugações do verbo amar. E junto todos os significados interpretáveis. Não lavamos o rosto, nem aquecemos a água para o café. No fogão apenas queimamos o livro de poesia que compramos na primavera.
Ah, como ou gozo o mormaço!

sexta-feira, 9 de abril de 2010

korsakov oceano

não é vaidade arrancar corações e vestir-me com eles no dia de carnaval cantando nas ruas as mesmas ocres melodias que se desbotam em meio ao confete e a purpirina axul roxo azul anil. não me é nada, porque agora sou palavras e quando sou palavras sou falso sentimento sou quase sempre essa beleza expurgada, grandiloquente, que se quer, que se quer, que se faz, ficarei nesse ritmo hoje, a repetição, os jogos letrados pois me quero um pouco mais fluxo, os dedos no teclado enquanto ouço as ondulações do mar ateravés de um violino, sobre o braço o caderno, as canetas e os esboço teimoso de um desenho, que se quer definição, preciso. sempre tive receio do desenho, pois alí só me dou uma chance, tudo é cuidadoso, sou cuidadoso, medido, e de respeito, olho, pras revistas na estante e todas as outas pessoas em volta de mim na biblioteca, mostrando meu despreendimento com o que escrevo, o que é esse texto se não um suspiro que me subiu vaporoso e eclodiu, lindo, lindo lento nos dedos. as cadeiras são mais vazias, já passa de uma da tarde, lá fora haverá o sol e o céu azul como não se queria fazer há dias, sim, há dias. no cinzento que marcava meus passos, a lama, o despero a sujeira de mim, a sujeira em mim, agora não é mais limpa, não é mais vistosa, passei, lavado e limpido por essas águas e saí o mesmo, sempre me crerei o mesmo, um improviso raro em alguns lábios e um desespero desconcertante de querer fazer-se algo, obra materialidade sempre tão descontente. acho que agora poderia terminar-me aqui, obrigar meus dedos a sangrarem enchendo tudo de nada, de letras e letras e sílabas, que não me valem, que não se revisam, que não se revitalizam. revidalizam-se. ontem, voltando pra casa, quando já me fazia só, quando já me tinha o vento enconlhendo-me todo no arrependimento, eu, como ninguém nunca me viu fazer, como sempre reservei-me pra mim, inútil e sem valia, comecei a ditar uns versos, umas valas uns nadas. sim e isso me parece sempre tão bom, não sei se por não ser tinta, por sem timbre mais macio do que me acostumo, por me desconhecer nesses momentos, por ser outro habitando corpo meu e não ser outro desconhecido e elevado, não ser outro vizinho transmutado, ser o eu interno que tanto acoberto ser a minha infantil noção das coisas que tanto se rebate em mim, que me sei também uma criança tardia, sempre com o brilho nos olhos de descobrir as coisas, sempre faminto e voraz. sou-me. nas horas vagas, na madrugada. eu parei agora, por uns segundos não havia palavras não havia mais nada a ser posto, sou um verme dos outros sou espera, dependo da criação animada que escorre de outras veias, de suas palavras, de suas imagens de suas suas asua, para fazer o meu, o meu é reflexo do seu, o seu é alimento, o seu é precisão, o meu é desdobramento.

domingo, 28 de março de 2010

das oliveiras.

Transmutado e lento
assim caminho pelos pórticos do dia. Há tanto
de mim nesses pedras, nessas vestes e nesse suor
que me escapa. Há tanto
de mim em tão pouco nesse ar, nesses suspiros
de recordações. Há tanto
em mim o desejo alucinante das madrugadas, da fumaça
e do odor ocre, tabacocriação de sua pele.
Foram-se as palavras para a originalidade conhecida
dos gestos excessivos, os olhares fixos e o toque.
Sútil queimadura em meus lábios. Desencontro
do cotidiano é um vazio acalentado pelo meu redespertar
lento. Somos frágeis, sabidos, escondemo-nos
por trás da vermelhidão da aurora.
Não há espaço em mim que você já não possa habitar.

sexta-feira, 19 de março de 2010

desembocadura.

desaguo no profundo
desalento do sol.
há vaidade em mim.
há vazio de mim.
se insisto no guiar-me
é pela facilidade do viver.

quinta-feira, 11 de março de 2010

balanço

desenrolo-me na manhã
reviro-me na noite
onde habitei nos dias
que perdi?